Dr. João Antonio Costa

Olá!

Bem vindo ao nosso blog. Aqui eu conto um pouco sobre minhas experiências dentro da Odontologia nos EUA e o Processo de Validação do Diploma de Odontologia nos EUA e minha jornada dentro da Boston University Henry M. Goldman School of Dental Medicine.

Espero que você aprenda bastante!

1000 palavras

1000 palavras

            A luta é real. Pode parecer que trabalhar com Odontologia nos Estados Unidos seja um sonho, um mar de rosas, um passeio no parque. Pode parecer tudo isso, sem deixar de lado que às vezes pode ser um pesadelo, um mar de lama ou um passeio pelo submundo. Quero deixar bem claro que eu não me queixo de tudo pelo que passei. Eu sempre procurei ter uma atitude positiva junto a críticas e momentos difíceis pelos quais passei. Conheci muita gente e procurei aprender com todas elas, seja através de um comentário feito, gesto observado ou sapo engolido. Tudo na vida serve como aprendizado para que a gente venha se tornar uma pessoa melhor.

            Em 2013 tínhamos uma Dentista colombiana trabalhando com a gente. Não era muito dada a conversa e parecia ter um forte apelo ao atendimento infantil. Nada mais. Não ficou muito tempo conosco, mas uma de suas interações com uma paciente em particular me ajudou a me moldar como um Dentista melhor. Este caso mudou de maneira definitiva o meu “approach” com pacientes de difícil lida e creio que tenha direcionado para uma mente mais aberta ao que os pacientes realmente necessitam, ao invés do que a gente acha que eles precisam.

            Certo dia esta colega me chamou para ajudar na elaboração do plano de tratamento para esta paciente. Ao contrário do que eu imaginei que fosse sentar-me na frente da tela do computador para analisar o plano de tratamento e observar uma imagem radiográfica, esta paciente estava ali, sentada na cadeira odontológica com cara de poucos amigos; característica trazida ainda hoje em consultas mais recentes. A dúvida da colega era com relação à condição periodontal da paciente que, a olhos vistos, não parecia nada promissor. Certamente quando uma condição periodontal se apresenta de maneira precária, uma das soluções seja a extração daqueles elementos comprometidos, e pelo que eu pude observar lendo as imagens radiográficas, pouco ou quase nada poderia ser feito para remediar aquela situação.

            Trazer uma notícia como esta para um paciente nunca é uma coisa fácil. Ainda que alguns deles cheguem até você já imaginando que as notícias que virão não são as mais animadoras, outros acham que a culpa deles chegarem até você naquela condição em absolutamente nada aponta para eles próprios e, claro que neste caso, foi justamente o que aconteceu. A culpa provavelmente recaía sobre mim, sobre o governo do Timor Leste, a morte as abelhas africanas ou mesmo ao nascer do sol em dias nublados. Qualquer coisa menos ela mesma. Naquele momento eu entendi que ficar de boca fechada pode me eximir de muitos problemas, mas foi um pouco tarde para eu captar a mensagem entrelinhas deixada pela colega Dentista que preferiu pular do cavalo e sair andando sem olhar para trás. Eu peguei a bomba na mão e carreguei comigo por mais de 10 anos.

            Eu acho que a primeira coisa que eu aprendi foi nunca antagonizar com um paciente de difícil lida, seja pela sua personalidade, dificuldade de comunicação ou mesmo chatice. Neste caso, parecia uma tempestade perfeita porque tudo parecia se concentrar naquele buraco negro de antipatia. Eu aprendi que tratar essas pessoas com o mais absoluto respeito pode te levar longe, ainda que não longe delas, mas pode te ajudar a entender que mesmo que nem tudo sejam flores, os espinhos que elas muitas vezes têm irão te fazer uma pessoa e um Dentista melhor.

            Neste caso eu procurei mudar o meu “approach” com esta paciente e percebi que o seu título acadêmico tinha um grande valor para ela, então nada mais justo do que usar os pronomes de tratamento adequados àquela conquista. Somente usando este artifício, já ajudou muito nas conversas profissionais muitas vezes não muito prazerosas. No caso desta paciente em particular a dificuldade era sempre trazer notícias que ela não queria ouvir e oferecer alternativas nem sempre como as mais ideais. Eu poderia simplesmente jogar uma bomba no colo dela, e me eximir de qualquer responsabilidade, como dizer que o caso dela não tinha solução e que dentadura seria a única opção viável, mas eu sempre entendi que extrações não eram uma opção aceitável e esta seria sempre a última alternativa como opção para ela.

            Raspagens radiculares, conversas motivacionais, encaminhamentos para especialistas e tudo mais que eu pude oferecer eu assim o fiz. Sempre procurei deixar muito bem claro as minhas limitações clínicas e administrativas, como não ter a capacidade ou habilidade de autorizar um tratamento mais avançado ou que não fosse coberto pelo seguro. Esta transparência acabou solidificando a confiança desta paciente em mim e no meu trabalho, e isto realmente é uma coisa que não tem preço.

            Esta semana eu dei a notícia de que eu estava me ausentando da companhia. Contei meus planos de retorno a Escola e conversei um pouco sobre a minha decisão de continuar andando para frente e na busca contínua de crescimento pessoal e profissional. Eu disse para ela que mesmo que eu não estivesse mais ali, a minha linha de pensamento com um perfil mais conservador em termos de não se mexer no que está quieto deveria ser a mesma mentalidade dela. Eu vi nestes últimos 10 anos uma pessoa muito motivada a manter seus dentes funcionais mesmo que as chances de permanência fossem muito pequenas. Todas as ferramentas, técnicas e materiais disponíveis para ajudar na manutenção daqueles dentes vinham sendo utilizados de maneira diária e eficaz e agora restava a ela a possibilidade de mantê-los da melhor maneira possível.

            Aquele abraço de despedida que ela me deu no final da consulta significou muito para mim. Foi como um “adeus” de alguém de quem eu ganhei o respeito profissional e, quem sabe, pessoal também. Foi uma despedida singela de alguém que se dispôs a andar a segunda milha junto com quem um dia procurou alguém para ajudar a levar um fardo difícil de ser carregado. Eu saio desta viagem com o coração tranquilo, certo de que a missão foi concluída.

Um abraço e sucesso sempre.

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