Dr. João Antonio Costa

Olá!

Bem vindo ao nosso blog. Aqui eu conto um pouco sobre minhas experiências dentro da Odontologia nos EUA e o Processo de Validação do Diploma de Odontologia nos EUA e minha jornada dentro da Boston University Henry M. Goldman School of Dental Medicine.

Espero que você aprenda bastante!

Lições que a gente aprende

Lições que a gente aprende

            Eu geralmente não inicio meus textos com o título. Na maioria das vezes eu escrevo tudo primeiro e depois eu procuro um termo ou frase que sintetize o assunto sobre o que eu escrevi. Neste caso, a melhor alternativa foi desenvolver tudo o que virá em cima da idéia pré-determinada.

            Em setembro deste ano, farão quinze anos desde que eu saí do Brasil. Até então pelo que eu sabia, para trabalhar como Dentista nos Estados Unidos era uma coisa impossível. Os dias, meses e anos se passaram e a realidade mostrou-se diferente. É possível, sim, estrangeiros trabalharem como Dentistas nos EUA desde que supram com alguns requisitos que se fazem necessários.

            De todos os caminhos que o país oferece para se trabalhar com Odontologia nos Estados Unidos, a Residência em Clínica Geral ou Especialidade se mostram alternativas interessantes, limitadas no aspecto geográfico, mas que oferece para aqueles que conquistam esta certificação, reconhecimento, prestígio e conforto. Mas o que eu quero dizer limitações no aspecto geográfico?

            Dos cinquenta Estados que formam os Estados Unidos, somente alguns possibilitam que os Dentistas estrangeiros trabalhem dentro de suas especialidades e ainda outros poucos permitem o exercício da profissão dentro da clínica geral. Eu creio que já discutimos este assunto por várias vezes e não vou me estender sobre o assunto neste momento. Mais informações é possível obter nas páginas deste blog.

            Eu gosto de contar a minha experiência. Não tenho condições de descrever o que terceiros passaram e não acho justo – ou certo – escrever sobre o que eu “acho” ser o que acontece, ainda mais porque são tantas variáveis que acontecem entre cada caso que conseguir descrever cada detalhe de cada caso particular não seria certo. Vou, então, com a minha história, porque eu sei dos detalhes, o que aconteceu e de que forma isto pode ajudar quem estiver lendo.

            Depois de anos trabalhando com Clínica Geral eu decidi partir para Endodontia, especialidade esta onde tive grandes nomes como referência profissional e grandes mestres que me ajudaram a formar um alicerce sólido de conhecimento e prática. Durante meus anos no Brasil, poucas vezes encaminhei casos e nunca me senti intimidado por dilacerações radiculares, pólipos pulpares, calcificações e degenerações pulpares, fossem elas cálcicas ou difusas. Quando eu cheguei aos Estados Unidos e vi a gama de materiais oferecidos disponíveis para trabalhar, eu sabia que a previsibilidade dos casos terminados seria alta e confiável.

            Quando decidi partir para o caminho da Residência em Endodontia, eu achava que tinha comigo o que poderia me diferenciar dos demais candidatos: experiência clínica. A idade eu imaginava que pudesse ser um problema, idéia que foi logo colocada de lado quando conversei com um Dentista graduado em Harvard e que ingressou no programa depois dos cinquenta e cinco anos. Eu tive a oportunidade de conversar com ele, falar sobre meus planos e ouvir dele – que se graduou como melhor da turma – que eu ainda era jovem e tinha tempo de sobra para buscar uma posição como Residente em qualquer programa.

            Confesso que eu meu nível de confiança continuou crescendo, ainda mais ouvindo isto vindo de alguém que ingressou em um dos programas mais prestigiados do mundo, depois dos cinquenta anos e ainda tendo sido graduado no Canadá. Tudo bem que existe uma diferença muito grande entre Canadá e Brasil, mas entendendo que as regras para “estrangeiros” valem para qualquer um que não tenha sido graduado nos EUA, eu e ele estávamos no mesmo barco.

            Meu próximo passo foi contratar um profissional que pudesse me ajudar na elaboração do meu Curriculum Vitae e a minha carta de intenção. Carta de intenção, para quem não sabe, é uma redação que deve ser redigida pelo candidato contando sobre a sua vida, valores e conquistas que tornem ele uma pessoa diferenciada das demais. Imaginando que todos os candidatos tenham boas notas, boas referências e excelente atitude, esta carta de intenção vai mostrar à junta de seleção, quem é você. Do que você gosta, quem você admira e o que te faz tão mais especial para que eles tenham interesse em ter você como membro do corpo discente do programa. Eu encontrei uma grande profissional. Atenciosa aos detalhes e disposta a ajudar, ela reuniu-se comigo algumas vezes para que eu contasse sobre a minha história de vida e ela entendesse quem eu era e o que deveria ser elevado nesta carta de intenção. Depois de algumas revisões, chegamos ao documento final que na minha opinião ficou excelente.

            Faltavam ainda a prova do INBDE para obter a aprovação – que no meio de março de 2022 chegou – e uma nota acima de 100 no TOEFL para que eu tivesse chance de ser selecionado para qualquer programa que aceitasse estudantes estrangeiros que não tiveram o idioma Inglês como base da sua educação. Obtive nota 101.

            O próximo tópico a ser trabalhado foi a obtenção de cartas de referência de pessoas que me conheciam profissionalmente e que pudessem testemunhar a minha habilidade e conduta profissional. Procurei ir atrás de pessoas, que na minha opinião, trariam confiabilidade para quem lesse suas descrições sobre mim. A primeira pessoa que eu pensei foi o meu antigo Diretor Clínico, recentemente ausentado do cargo por motivos profissionais. Eu sabia que, ainda que não sendo mais meu Diretor Clínico, eu e ele tivemos várias oportunidades de trabalhar um com o outro e ele era a pessoa mais adequada para descrever a minha conduta profissional. A segunda pessoa a quem eu busquei recomendação foi o antigo CEO do Community Health Center onde eu trabalhei. Para mim, uma grande mente dentro da saúde comunitária no país. Seu nome hoje é referência dentro da comunidade nacional, tendo sido CEO por mais de 20 anos do primeiro Community Health Center dos Estados Unidos. Ele administrou mais de 400 pessoas, participou de momentos difíceis da política local para ajudar na permanência dos programas de saúde da comunidade, tendo sido reconhecido pelo Governador do Estado de Massachusetts e tendo sido ainda, em vida, homenageado com o seu nome dado ao Centro onde ele trabalhou por mais de 40 anos.

            Depois de tudo coletado, pago e enviado eu só precisava esperar o convite para uma entrevista. Eu aprendi que a Residência em Endodontia é o programa que faz o seu processo seletivo mais cedo comparado com os demais programas. A instrução que eu obtive foi de enviar a minha aplicação logo no primeiro dia de abertura das inscrições, no caso dia 12 de maio. Achei que talvez fosse muito cedo, ainda mais porque vários programas tinham como data final para o envio das aplicações dia primeiro de agosto. Como eu não queria deixar nada para última hora dia 13 de maio tudo foi enviado (atrasei um dia porque demorou para chegar a segunda nota do TOEFL. O plano foi obter o resultado uma semana antes, mas na primeira prova eu fui muito mal e tive que refazer uma semana depois).

            Os dias foram passando e nada de convites para entrevista. Ainda estava cedo e eu não estava muito preocupado, ainda mais porque o programa que eu queria ser chamado já tinha sua data de entrevista agendada – 15 de julho – e a data final para inscrição era dia primeiro de julho. Eu imaginava que qualquer dia depois desta data eu receberia um email me convidando para ser entrevistado. Procurei deixar as pessoas no trabalho sabendo de uma possível ausência inesperada e, quem sabe, boas notícias a serem trazidas. A primeira semana de julho chegou, mas o e-mail nunca veio.

            No final desta primeira semana, eu encontrei um fórum online, composto por candidatos à Residência em Endodontia. O intuito deste fórum é trocar informações sobre programas, requerimentos e dicas sobre o processo de aplicação. Descobri neste dia que o programa ao qual eu esperava um e-mail de convite para entrevista enviara os convites no início de junho. Mas... eu não recebi nada. Voltei para a minha caixa de spam e procurei lixo, por lixo, qualquer coisa que talvez não tivesse sido enviada para minha caixa de mensagens. Nada. A frustração começou a aumentar e um antigo sentimento de derrota, que há muito tempo eu não sentia, refloresceu.

            “O que eu fiz de errado?” “Ficou faltando alguma coisa?” Perguntas e mais perguntas que não saiam da minha cabeça. Tentei entrar em contato com pessoas que já tinham passado por este processo e nada. Nada me vinha como resposta do “por que” eu não tinha recebido um convite para uma entrevista. Foi quando eu me lembrei de um vídeo que eu vi no Youtube sugerindo que a gente entrasse em contato com os diretores de programa perguntando o que se poderia fazer de diferente em um próximo ciclo de aplicação para tornar nossa aplicação mais atraente para o comitê de seleção.

            A resposta que eu recebi não foi muito bem a que eu queria, mas foi o que eu precisava saber para entender que eu estava jogando um jogo ao qual eu não estava preparado. A analogia esportiva é muito interessante porque, no meu caso, seria como seu eu estivesse indo nadar uma prova de natação de cem metros usando chuteira, meia, caneleira, shorts e camisa. Os requerimentos observados pelos comitês de seleção não foram observados em nenhum momento na minha aplicação. A experiência clínica é válida e importante, mas experiência em consultório particular, a conclusão de um AEGD ou GPR, exposição a temas de pesquisa relevante, tudo o que eu não apresentei na minha aplicação. Ou seja: não adianta somente ter a disposição para ingressar, é preciso cumprir alguns pré-requisitos que são subentendidos por quem está aplicando.

            No final das contas, toda esta experiência serviu para me mostrar que eu tenho chance, sim, de ingressar em um programa de Residência em Endodontia. Eu preciso ir atrás de algumas qualificações que eu não disponho no momento. Talvez se eu tivesse tido experiência em pesquisa enquanto no Brasil, artigos publicados, quem sabe um mestrado ou doutorado as minhas chances seriam melhores. O que eu quero dizer bem claro com este texto é que se você tem o desejo de fazer residência em Especialidade dentro da Odontologia nos Estados Unidos você deve demonstrar que você tem o que é preciso para ser escolhido. Lembre-se que aqui nos Estados Unidos não é o candidato que escolhe a Escola onde quer ir, é a Escola que seleciona o candidato. Se você não conhece pessoas de relevância local para escrever sua carta de referência, procure entre seus pares e conhecidos pessoas de renome acadêmico, que possuam credenciais profissionais que deem peso e suporte no momento da aplicação. No meu caso, as pessoas que eu escolhi eram pessoas de peso e que me davam o respaldo necessário, mas infelizmente nenhum deles de renome acadêmico ou profissional dentro da Endodontia. São lições que a gente aprende.

            Um abraço e sucesso sempre

             

Fé

Recapitulando

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