Recapitulando
Há cerca de duas semanas eu postei aqui no blog um texto falando sobre a minha frustração por não ter sido chamado para uma entrevista em um determinado programa de Endodontia em uma famosa instituição de ensino norte americano. Ficou longo, prolixo e com uma pitada de “coitadismo” que realmente não creio ter sido a minha melhor performance. O que acontece, no entanto, é que eu precisei trilhar o caminho que tantos fazem muitas vezes sem qualquer sucesso. Dois, três, quatro ciclos de aplicação para conseguir ser aprovado para um dos programas mais competitivos aqui nos Estados Unidos. Vou contar a minha história.
Até um ano atrás – aproximadamente nesta mesma época do ano – se você me perguntasse se eu gostaria de fazer uma pós-graduação em Odontologia nos Estados Unidos a minha resposta certamente seria não. Não, porque o trabalho que venho fazendo me satisfaz profissionalmente. Em 2018 eu perguntei para o meu Diretor Clínico se ele recomendaria eu partir para o Advanced Standing Program. Ele me perguntou se eu gostaria de trabalhar em consultório particular. A minha resposta veio quase no mesmo momento que ele terminou a pergunta. Foi um sonoro não! Não mesmo, de jeito nenhum. O trabalho que eu vinha exercendo estava ótimo e eu não me via partindo para dois anos de um curso caro e que me impediria trabalhar.
Tudo mudou em Setembro do ano passado quando meu irmão foi aprovado no INBDE. Se ele passou, eu também poderia fazê-lo. Concentrei meus esforços para a preparação e estudo. Neste interim, a ideia de fazer uma Residência em Endodontia aconteceu, porque já que eu teria um dos pré-requisitos mais difíceis de se obter a fim de me tornar elegível para concorrer a uma vaga, porque não concentrar meus esforços em me tornar um Endodontista e terminar meus dias somente fazendo Endo? Comecei a buscar informações sobre os programas de residência e cheguei ao vídeo de um professor norte-americano dando algumas informações de como conseguir se chamado para um programa. Dentre as dicas dadas ele sugeriu: Ingressar como membro da American Association of Endodontists, visitar programas, participar do encontro anual da AAE para fazer network e criar um portfolio com casos clínicos concluídos.
Em dezembro de 2021 eu entrei em contato com um Professor de dois programas de Endodontia em Boston. Professor na Boston University e em Harvard. Conversei um pouco com ele e o que a gente conversou não foi nem um pouco animador. Ele disse que Harvard e a Tufts University não considerariam aplicação de candidato graduado fora dos EUA. Na Boston Univeristy ele disse que as chances eram mínimas porque eles oferecem vagas de 2, 3 e 5 anos e que a concorrência era muito, muito grande. A bem da verdade, eu deixei de considerar os programas em Boston, não pelo que ele me falou, mas por conta do valor exigido. Os cursos em Boston são muito caros e, por que aplicar para um programa tão caro se existem outros tão bons e mais em conta?
Ainda que eu não tivesse Diploma de Odontologia emitido nos Estados Unidos eu tinha ao meu favor quatorze anos de serviço dedicado à Comunidade. Uma larga experiência clínica e muita vontade de aprender. Quem não tem isso? Quem é que se dispõe a dedicar sua vida profissional à uma única área de atuação e que não tem muita vontade de aprender? Pelo menos seria isto que eu deveria incutir na minha cabeça para uma possível entrevista, já que uma das perguntas que provavelmente seriam feitas é: Porque Endo depois de tanto tempo?
Em janeiro de 2022 eu fiz a inscrição para o Encontro Anual da AAE que aconteceria em Phoenix, AZ. Creio ter sido um dos primeiros a fazer a inscrição. Uma vez ali eu poderia entrar em contato com diretores de programas, fazer network com Residentes e outros Endodontistas e, quem sabe, aumentar as minhas chances para uma eventual oportunidade. O problema foi que eu precisei cancelar a minha ida para Phoenix por motivos pessoais. Sem drama... eu simplesmente cancelei a viagem e continuei a outra parte do plano que era visitar dois programas de Endodontia.
O primeiro programa foi na Univeristy of North Carolina. Passei dois dias ali, participei de uma reunião com os Residentes e achei que tivesse dado uma boa impressão. O único problema foram os dois primeiros minutos quando eu cheguei ali. Logo de cara eu conheci a chefe do Departamento da Endodontia – graduação. Uma brasileira que me perguntou se eu queria também fazer o mestrado em Endodontia. Como primeira resposta veio um “não sei...” e ali eu já vi que as minhas chances não seriam muito boas. Isso porque a UNC somente oferece Residência em Endodontia em curso de 3 anos junto com um Mestrado. Eu tentei desconversar, mas não deu muito certo. Ela disse que eu deveria partir para um outro programa de dois anos como o que ela fez. No meu segundo dia ali, eu tive mais contato com o Diretor do Programa de Residência de Endodontia que se mostrou muito atencioso e solícito. Com ele, sim, achei que tivesse me conectado melhor. Eu achei que ainda tivesse esperança.
Na segunda viagem eu fui para Houston e ali fiquei dois dias e meio. O primeiro e segundo dia foi para turismo e a reunião com o Diretor do Programa de Endodontia seria logo pela manhã de uma segunda feira. Neste dia eu percebi que aquela visita em Houston nem de longe foi proveitosa como a que tive na UNC. Conversei por dez minutos com o Diretor do Programa. Ele me levou para conhecer o Departamento, me apresentou para alguns funcionários e me levou para conhecer a Clínica de Endodontia. Meia hora depois eu estava saindo do prédio da Faculdade com pouca esperança. Como eu poderia dar uma boa impressão com meia hora de conversa? Essa diferença eu tiraria na Entrevista que estava marcada para o dia 15 de julho. Tudo o que eu precisava fazer era terminar a minha aplicação da melhor maneira possível e esperar pelo convite para entrevista.
Dia 12 de maio eu mandei toda documentação para aplicação. Dia 13 de maio eu recebi um e-mail notificando que a aplicação tinha sido recebida. Agora era somente aguardar receber o e-mail de convite e avisar a minha Diretora Clínica sobre uma viagem inesperada para ser entrevistado para um programa de Endodontia. E os dias foram passando. Entre cada paciente, no momento de colocar as minhas anotações clínicas eu procurava por um e-mail na minha caixa de mensagem. Nada... Talvez nada viesse ainda porque o término das inscrições seria ainda no dia primeiro de julho. Estava cedo. Tudo bem. Junho chegou. Nada de convite ainda. No meio de junho a bigorna da realidade caiu sobre a minha cabeça.
No meio de junho eu encontrei um fórum online de candidatos aos programas de Endodontia. Funcionando mais como um grupo de suporte, este fórum oferece informações sobre os programas e trocas de experiência de candidatos que estão aplicando e que já aplicaram e foram aceitos. “Faça isso”, “Não faça aquilo”. Ideias e direções a serem seguidas por futuros residentes. Neste fórum eu encontrei a lista de todos os programas e as datas em que eles chamaram seus candidatos para entrevista. Para meu desencanto, Houston chamara seus candidatos no início do mês de junho, quase um mês antes da data limite para inscrição. Outros programas que eu também tinha aplicado, a mesma coisa. Dias antes do término das inscrições os convites já tinham sido enviados. Foi um banho de água fria. Foi então que eu tive uma idéia.
Decidi entrar me contato com um dos Diretores de um programa que eu apliquei e não fui chamado para entrevista. Perguntei o que eu poderia melhorar na minha aplicação para que no próximo ciclo eu tivesse mais chance. Ele respondeu que o comitê que avalia as aplicações vê coisas como conclusão do AEGD ou GPR, exposição em pesquisa científica relevante, GPA alto e rank de classe. Ah... OK. Tudo o que eu não tenho. Quer dizer que todo meu esforço para viagem, investimento financeiro e de tempo acabou indo para o ralo? Em parte, sim. O dinheiro que eu usei para aplicar para os programas eu nunca mais vou ver, mas viagens valeram a pena. Conheci gente muito boa e conheci um lado dos Estados Unidos que eu não tinha qualquer familiaridade.
O ponto a que eu quero chegar é: Não basta querer fazer alguma coisa. É preciso trabalhar – e muito – para conseguir o que se quer. Um Dentista Americano não decide da noite para o dia que irá fazer uma Residência em determinada área sem antes se preparar assiduamente e constantemente para tal. Se você está no Brasil e quer fazer Residência aqui nos Estados Unidos, comece hoje mesmo a buscar informações de como se envolver em pesquisa na área que você deseja. Se eu tivesse um mínimo de experiência em pesquisa talvez eu tivesse mais chance. Agora não deu, tudo bem. Existem alternativas. Demorou para eu assimilar e entender que o jogo é mais difícil do que eu imaginava. Claro que se eu tivesse alguém para me orientar inicialmente nada disso tivesse acontecido. Eu sei que acabei me deixando levar pelo fato de eu ter uma longa experiência clínica em solo americano, mas infelizmente esta experiência prévia nem de longe me tornou um candidato a ser considerado. Outras chances virão e eu sei que estarei mais bem preparado.
Um abraço e sucesso sempre.