Uma nova experiência
Comentei no twitter ha um tempo que eu iria pescar lagosta naquele final de semana. O marido de uma das recepcionistas da Clinica onde trabalho me convidou. Ele já faz isso ha mais de 30 anos.
No ano passado quando estivemos na casa deles para um jantar, ele me convidou para que um dia eu fosse com ele. Eu aceitei. Certamente uma experiência a qual nunca tive a chance de ter. Para quem cresceu na cidade, o mar se resume exclusivamente a praia e vez ou outra um passeio de escuna, banana boat ou jet-ski. Sempre como diversão. Nunca como profissão.
O dia começou bem cedo. Quatro da manha eu estava de pe. De acordo com o que fui informado, deveria usar roupa leve, mas em camadas. Uma camiseta, uma camisa polo e um moletom com capuz. A calça, qualquer uma que me desse conforto. Outra coisa: um boné para proteger a cabeça contra o sol. Logo quando cheguei na casa deles ele me deu um par de botas e uma vestimenta parecida com um avental de borracha. Protegia dos pés ao peito. Cor de laranja para chamar bastante a atenção. Quando saímos de sua casa o dia já estava bem claro. Nem pareciam cinco horas da manha. O barco não é um barco grande. São 27 pés. Cabem duas pessoas em pe. E 20 armadilhas para lagosta. As armadilhas são como gaiolas com duas entradas. Cada uma delas comporta geralmente de 3 a 4 lagostas. Pesa alguma coisa entre 15 quilos e esta presa por uma corda e uma boia. O plano para o dia era trocar as armadilhas de lugar pois as lagostas estavam se concentrando em um lugar diferente do esperado. Cada grupo de armadilhas é composto de 20 delas, distribuídas em uma linha reta com uma distancia de 50 metros entre cada uma delas. Meu papel no dia, era deixar o barco alinhado, preparar as iscas para as armadilhas e prender as pinças das lagostas logo que chegassem. Olha... eu criei um respeito muito grande por quem faz isso para viver. Se você nunca tentou pilotar um barco, eu garanto que está longe de ser a coisa mais fácil e simples do mundo. Achar um ponto de referencia para manter a proa do barco é a meta numero um.
Quando você tem terra a vista, fica fácil. Mas e quando você só depende de referencias que não são visuais, como o brilho do sol no mar ou se mirar pela bussola do barco? A bussola fez toda a diferença durante a expansão marítima dos países ibéricos, mas usar uma bussola para se guiar no mar é como usar um espelho clinico para fazer remoção de carie por visão indireta. No barco, quando se move o leme para a esquerda a bussola move para a direita e vice-versa. Você não pode sair da linha mostrada pelo GPS, tem que compensar a ação do vento e o movimento do barco. Tudo ao mesmo tempo, olhando para a bussola, o GPS ou o ponto marcado no horizonte.
Se você achar um. A linha do horizonte parece uma linha solida interminável. Achar referencia ali é impossível. Eu durei três rounds que deu um total de seis viagens. Era preciso recolher as armadilhas, limpa-las e prepara-las com a isca (pele de restos de peixe. Imagina o cheiro...). Depois de recolher as 20, era preciso ir para outro lugar para coloca-las de volta no mar e ir buscar, preparar e jogar outras 20. O plano para o dia era fazer 4 destas viagens. No final da terceira eu realmente não aguentei.
O vento começou a ficar muito intenso e o cheiro das iscas, e o balanço do mar me fez me sentir muito mal. Minha experiência no mar pescando lagosta durou cerca de 5 horas. Tempo mais que suficiente para provar para mim mesmo que a Odontologia é realmente o meu chamado. Além de ter um respeito enorme por quem faz isso todos os dias para sobreviver, pode me dar uma noção do que Pedro passava antes de ter sido chamado por Jesus. Mas isso é assunto para outra história.
Ah... eu não tirei nenhuma foto. Entre deixar o barco alinhado e tirar fotos eu preferi a minha sobrevivência. já pensou a manchete? Dentista desaparece depois de tentar bancar o pescador. Não seria matéria de primeira pagina? Vocês podem me perguntar se eu voltaria. Pode ser que sim. Depois que a lembrança daquele vai e vem sair da minha cabeça. Por enquanto, lagosta, só para comer mesmo.